sexta-feira, 27 de novembro de 2009

O BE de Alcácer no Setúbal na Rede

Assento Parlamentar (BE)por Adelino Lopes(Militante do Bloco de Esquerda)

Pequeníssimo contributo para a história da génese da corrupção

Há uns anos, um cronista da nossa imprensa (cujo nome lamento profunda e sinceramente não conseguir recordar) brindou-nos com a melhor das definições do princípio da CORRUPÇÃO. Creio que o título da crónica era mais ou menos isto: Se houver algum problema, DIZ QUE VAIS DA MINHA PARTE.
Este DIZ QUE VAIS DA MINHA PARTE não me tinha, até aí, soado a nada.

Faz tanto parte da nossa vida de portugueses como os coentros, a salsa, o louro, o azeite; ou como ter que acordar todos os dias para ir trabalhar, estudar ou passear a indigência; ou ainda como achar perfeitamente natural que a mulher continua a ser a mulher-mãe-mudadora de fraldas-mamadeira-cozinheira-frágil-companheira-de-tudo-feliz por tudo isso e por ser mãe-porque parir não custa nada e por ter filhos é que se é mulher e/ou ser humano glorificado e o marido gosta, gosta imensamente e se sente um herói porque também muda fraldas, e “ajuda” a outra e mais ainda porque ela é uma ministra, executiva, professora ou secretária de direcção nunca abdicando de ser esposa; ou ainda como, a um nível socialmente muito mais elevado na minha terra, um delegado de equipa a um jogo de futebol da 3ª divisão distrital, janta candidamente com o árbitro após o encontro, depois de ter dado dois sopapos no “outro” mafioso, porque isso é absolutamente natural na defesa da nossa dignidade; finalmente, como ter o(a) amigo(a) numa qualquer repartição pública, numa qualquer secção de pessoal privada, num departamento de estado, autarquia ou coisa que o valha, e sentir (muito mais que pensar) que ele(ela) nos deve o supremo favor de sermos amigos(as) de infância ou de circunstância.

O segredo de tudo isto encontra-se, porém, no denominador comum: a MINHA PARTE é sempre a parte mais forte, o lado do PODER, quaisquer que sejam as formas que assuma. Mesmo no caso dos coentros ou dos rabanetes: fossem eles gente, e optariam pelo lugar de condimentos de refeições mais nobres, mais jet. Com claras dificuldades de integração no meio, a beldroega, perdida entre calçadas ou escalrracho, poderá sempre pedir uma audiência ao chef, mas nunca sem a mediação do coentro, que a aconselhará a dizer, antes de mais, que “VAIS DA MINHA PARTE”.

IR DA PARTE DE transformou-se em instituição nacional, quase num axioma e, em certos casos, em verdadeiros arroubos de patriot(eir)ismo. Tão transversal a esta riquíssima e lusa comunidade como um verdadeiro campeonato do mundo de futebol, onde se compara a qualificação da selecção nacional para o Mundial da África do Sul com a passagem do Cabo das Tormentas. Tenho sérias dificuldades (ou dificuldades de aprendizagem, quem sabe?) em encontrar esta mãe d’água…
Adelino Lopes - 27-11-2009 10:11

in:http://www.setubalnarede.pt/content/index.php?action=articlesDetailFo&rec=11631

1 comentário:

  1. “Atalhar caminho”

    No momento em que escrevo estas palavras já não consigo detectar no nosso planeta sinais de qualquer ser humano vivo, e temo em breve ir juntar-me a todos os demais, mas este meu último acto quero realizá-lo na convicção de poder ajudar alguma civilização que possa um dia visitar a Terra e que venha a encontrar esta mensagem.

    Nós terminámos desta forma pois a pouco e pouco fomo-nos alheando um dos outros enquanto seres iguais e criámos formas de divergir, de nos tornarmos de mais em mais diferentes e distantes, de criar clivagens a todos os níveis até se atingir o fim que desde há algum tempo se adivinhava.

    Foram várias as formas que encontrámos para nos conseguirmos dividir cada vez mais, desde os títulos às classes, do dinheiro ao poder, dos cultos às crenças, da cor da pele à diferença de idade, das tribos às regiões, enfim tudo serviu para que não nos olhássemos mais como semelhantes, mas como dissemelhantes e até como fardos uns dos outros.

    Passamos depois a adorar as coisas que dominávamos e possuíamos, mas era uma adoração efémera pois logo queríamos possuir outras coisas e desta sensação de domínio das coisas, passámos sem nos darmos conta, a ser dominados por essas mesmas coisas, o que nos afastou ainda mais uns dos outros.

    Por fim já fazíamos parte não de uma sociedade, mas de uma economicidade, em que éramos tratados como meios de produção, como números para as empresas para as quais trabalhávamos e para o estado que nos cobrava impostos, até limiares que começaram a tornar-se incomportáveis, tal era a ânsia de resultados imediatos.

    E para culminar toda esta forma de degradação acelerada eis que surge uma gripe desconhecida, para a qual logo se produziu a respectiva vacina, mas como não era suficiente para todos logo os poderosos do topo da pirâmide resolveram criar uma lei para vacinar primeiro os imprescindíveis, onde eles próprios estavam incluídos.

    Mas o vírus avançou de forma tão terrível e devastadora que se esqueceram que qualquer pirâmide sem a sua base não é sustentável e quando tentaram emendar a mão já era demasiado tarde e toda a pirâmide se desmoronou, levando à extinção da nossa raça, pois os que sobreviveram por via da vacina, só depois se deram conta de que não conseguiam sobreviver sem os outros.

    E eu que tive a infelicidade de ter vivido estes minutos para além de todos os outros e de ter assistido a todo este horror espero pelo menos ter contribuído com este meu último escrito para salvar alguma outra civilização que ao lê-lo esteja ainda a tempo de atalhar caminho.

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